Teoria do Jornalismo: “bode que é bom berra na sala!”

Roberto Villar Belmonte*

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Prezado admirável mundo novo, do tudo ao mesmo tempo agora, das torcidas fanáticas de avatares, dos ciborgues em conexão compulsiva, dos terabytes de memória na ponta dos dedos, das intermináveis versões do mesmo, das muitas – mas tantas vezes inexploradas – possibilidades do diferente, das solidões interativas em múltiplas plataformas de auto publicação, dos amigos que nunca conheceremos, qual o papel que reservas para o Jornalismo neste teu mundo de fragmentos?

Neste admirável mundo novo está mais fácil e também mais difícil fazer Jornalismo. A internet, que facilita a apuração e a distribuição, dificulta a comercialização. Se qualquer um informa, para que investir em serviços jornalísticos? Se tudo é gratuito na rede, por que pagar pelo Jornalismo? Porque alguém ainda precisa responder com credibilidade e profissionalismo à pergunta primordial: o que está acontecendo? Quem tem capacidade de fazer isso são os jornalistas, quando fazem Jornalismo.

Diante das mudanças estruturais em curso – com novas formas de produção de notícia, processos de convergência digital e crise do modelo tradicional de negócio da empresa jornalística – é verdade que o Jornalismo anda meio desnorteado. No entanto, é justamente neste admirável mundo fragmentado e hiperconectado que a profissão de jornalista é ainda mais necessária, não para entreter apenas, pois para isso há uma abundância de opções disponíveis, mas para praticar Jornalismo.

Já que agora todo mundo publica, o Jornalismo precisa mais do que nunca apurar, entrevistar, conferir e cruzar dados, chancelar informações, fazer perguntas, muitas perguntas; precisa pautar a sociedade, precisa dizer a boa nova, mas também revelar e interpretar o que está por trás, esquivando-se da enxurrada incessante de amenidades. É neste admirável mundo novo que o Jornalismo precisa renovar permanentemente o seu compromisso ético de colocar o bode na sala.

Bode na sala? Explico. Aprendi essa de um veterano repórter investigativo. Cobria praia na época. Sucursal em Tramandaí. Quais eram as pautas? Bingo clandestino, esgoto sem tratamento, roubo nas prefeituras, tráfico. Lá pelas tantas decidiram que notícia na praia tinha que ser só serviço e alegria. Foi então que ouvi a frase: “jornalista tem que botar o bode na sala, mostrar o que ninguém quer ver”. É desta gente que o admirável mundo novo precisa, de profissionais comprometidos com o Jornalismo.

*Artigo originalmente publicado no Unipautas, jornal da Faculdade de Comunicação Social da UniRitter de Porto Alegre (RS) no primeiro semestre de 2015 (Ano III, n.6)

3 comentários em “Teoria do Jornalismo: “bode que é bom berra na sala!””

  1. Republicou isso em Tempus fugite comentado:
    “Já que agora todo mundo publica, o Jornalismo precisa mais do que nunca apurar, entrevistar, conferir e cruzar dados, chancelar informações, fazer perguntas, muitas perguntas; precisa pautar a sociedade, precisa dizer a boa nova, mas também revelar e interpretar o que está por trás, esquivando-se da enxurrada incessante de amenidades. É neste admirável mundo novo que o Jornalismo precisa renovar permanentemente o seu compromisso ético de colocar o bode na sala.”

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